QUE APATIA JUVENIL, CARA PÁLIDA?
No afã de promover a reportagem Diários Secretos, que alçou-o aos picos da glória, o jornal Gazeta do Povo e a RPCTV estão empenhados em politizar a juventude a fórceps. Seja em campanhas veiculadas na TV comparando “caras pintadas” e “caras limpas”, seja no debate que promoveu-se nesta semana no Teatro Paiol, de título pomposo: “Diários Secretos e a Apatia Juvenil”.
O cientista político Adriano Codato, professor da Universidade Federal do Paraná talvez tivesse a resposta mesmo antes de sentar-se entre os convidados: se não há caras pintadas aglomerando-se em frente à Assembleia Legislativa do Paraná, centro nervoso de ocasião dos escândalos do estado, talvez a causa esteja num fato inexorável da recente história brasileira: a banalidade da corrupção.
Quando desencadeou-se o processo que levaria ao impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992, a democracia no Brasil era incipiente e os horrores do regime militar ainda estavam frescos na memória de muitas pessoas. Não que durante a ditadura não houvessem casos de corrupção. Houve aos montes. E alguém há de lembrar que o governador do Paraná, Haroldo Leon Peres, foi cassado, em 1971, sob esta acusação. Mas a imprensa não os publicava simplesmente porque estava sob o crivo da censura.
Esperava-se que com a redemocratização do país, as manifestações ganhassem corpo e a ruas fossem tomadas por protestos. Foi o que, a princípio, ocorreu. Desde o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), no entanto, os apupos juvenis cresceram em ordem inversa aos escândalos
Se houve manifestações elas ocorreram isoladamente e, mesmo assim, com a participação de um número cada vez menos expressivo de estudantes. Os governos contabilizaram com orgulho: foram mais de 80 operações da Polícia Federal no período do governo tucano e, dizem agora, mais de 1000 sob os auspícios de Lula. Mas o que deveria ser uma bomba – afinal a maioria das empreitadas da PF envolvia dinheiro público – ttransformou-se em traque.
A Gazeta do Povo e a RPCTV, talvez, esperassem, ressuscitar o movimento estudantil com as denúncias dos “Diários Secretos”, mas há um denominador comum em todos os casos investigados até aqui: a impunidade.
Não se tem notícia até hoje de parlamentar que tenha sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e, salvo exceções, que sequer tenha amargado a prisão. Muito pelo contrário.
Diante de um quadro assim, é difícil fazer com que a tal apatia juvenil transforme-se em animus politicus – se é que essa é a expressão correta em latim.
Como agravante, o governo Lula, que agora se encerra (2003-2010), beneficiou-se do silêncio das organizações estudantis e sindicais nos escândalos que pipocaram nos jornais, principalmente a partir do mensalão em 2005, abastecendo-as com verbas públicas e com leis que garantiram, por exemplo, a continuidade da contribuição compulsória às entidades de trabalhadores. Para quem não se lembra, a Força Sindical, presidida pelo deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, comemoraram com litros de uísque da melhor marca, a continuidade do benefício.
Esperava-se mais do professor Adriano Codato, um especialista na área, mas parece que sua afirmação veiculada em redes sociais de que é um “ser” politicamente correto o tenha impedido de versar sobre o tema.
Codato, certa feita, foi convidado pela Gazeta do Povo a escrever um pequeno artigo sobre o nepotismo. Na ânsia de teorizar perdeu-se no princípio que era o verbo.
Pois o professor da UFPR poderia muito bem ter discorrido sobre a banalidade da corrupção tal como a filósofa Hannah Arendt, certa vez, abordou a banalidade do mal, tomando como exemplo o nazista Adolf Eichmann, um dos arquitetos da “solução final”. Eichmann foi raptado num subúrbio de Buenos Aires por um comando israelense, em 1960, e enforcado no ano seguinte.
Hannah acompanhou, durante meses, o julgamento em Israel e concluiu, estarrecida, que estava diante de um ser medíocre. Um arrivista de pouca inteligência, incapaz de qualquer discrminação moral. Um burocrata pronto a obedecer a quaisquer ordens e justificá-las com clichês sem consistência que lhe construíam o caráter.
Codato é um especialista em Nicolau Maquiavel, rejeita muito acertadamente o termo "maquiavélico" e poderia ter lançado mão da sabedoria do autor de “O Príncipe” para explicar o significado político da tal “apatia juvenil” que a Gazeta do Povo e a RPCTV, tão insistentemente, identificaram nos estudantes. É lamentável que tenha desperdiçado a oportunidade. Quanto aos outros convidados no debate, mastigaram clichês. O pior clichê, diga-se.
1 comentários:
Concordo contigo, principalmente onde comenta: "...o governo Lula, que agora se encerra (2003-2010), beneficiou-se do silêncio das organizações estudantis e sindicais nos escândalos que pipocaram nos jornais, principalmente a partir do mensalão em 2005, abastecendo-as com verbas públicas e com leis que garantiram, por exemplo, a continuidade da contribuição compulsória às entidades de trabalhadores."
No Brasil apenas as esquerdas manifestam com passeatas. A direita se manifesta por escrito. O que dá resultado é passeata, aglomeração de manifestante. E as esquerdas estão no poder há pelo menos 15 anos, portanto perderam um pouco a "vontade" de manifestar, pois teriam que cortar o próprio dedo. Então a corrupção pode se transformar em algo banal, pois não tivemos mais ninguém combatendo. A esquerda, a direita, ou as duas tem que mudar o "modus operandi" ou continuará como "d´antes na terra de Abrantes"
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