O ESFAQUEADOR DA FANÁTICOS

A caveira da torcida "Fanáticos" (acima) e o presidente da torcida, Julião, quando ainda não se elegera vereador. "Atlético Até a Morte": de dar arrepios.

Foi o repórter fotográfico da Gazeta do Povo, Rodolfo Bührer, quem clicou a cena, lá se vão dez anos. Ele testava a teleobjetiva da máquina quando mirou o clarão na torcida. Foi o tempo de disparar uma sequência de fotos que retrataram o esfaqueador da torcida Fanáticos, do Atlético, atingindo membros da também atleticana Ultras. Uma das vítimas aparece sendo golpeada no ombro e no braço. A briga também foi gravada pelas câmeras da TV Globo e ganhou os telejornais do país.

Como o esfaqueador entrou na Arena? Simples. As organizadas recebem regalias dos cartolas do clube, entre elas ingressos mais baratos, aluguel de ônibus nas viagens que o time faz pelo interior do estado e, principalmente, vista grossa nas revistas. Muitas vezes, sequer se sujeitam a tal procedimento.

Daí não causar admiração que um dos membros da Fanáticos tenha ingressado no estádio de posse de uma arma branca, risonho e folgazão.

Por acaso eu trabalhava na Gazeta, à época. Por acaso na editoria de Esportes. E, por acaso, a sede do jornal ficava próxima à delegacia de Homicídios. Quando o esfaqueador foi preso, corremos, eu e Rodolfo Bührer, uma quadra e meia para encarar o criminoso. Não demorou muito, ele deixou a sala de depoimentos e conversou conosco. Mas já não era mais o lobo, era o cordeiro. Com roupa de metalúrgico, camisa de brim grosso azul, calças do mesmo tecido e cor e botas de segurança com solas grossas de borracha.

O pai o acompanhava, assustado. Ofegante, chegaria depois o repórter de uma rádio, que exigiu uma entrevista com o esfaqueador. Já descendo as escadas para ganhar a rua, ele se recusou. E foi nesse momento que a coisa ficou surreal. O repórter enfiava o gravador na boca do rapaz e ele o rechaçava. Indignado, o “latinha” resolveu partir para a briga. E aí a cena lembrou um verso de Oswald de Andrade: “pernas e braços na calçada”.

Com as fotos de Bührer mais o depoimento do esfaqueador, abrimos duas páginas do jornal e ganhamos aquela fama ligeira de todo jornal. No outro dia, a mesma matéria já forrava a gaiola do periquito. Mas o episódio ficou vivo.

Lembrei, de imediato, que a Fanáticos, certamente a torcida mais violenta do estado, já havia protagonizado espetáculo deprimente em 1998, a caminho de Irati, quando seus integrantes incendiaram uma borracharia e seu presidente, Julião da Caveira, o hoje vereador Julião Sobota (PSC), resolveu “rezar” engatilhando uma pistola 9mm e dando tiros para o alto.

Tanto terror assim tem origem. O lema da Fanáticos é “Atlético Até A Morte” e o símbolo, uma grande cabeça de caveira, é ostentado em todos os jogos do time. É mesmo de causar arrepios.

Com tanta violência subliminar não admira, portanto, que Julião da Caveira tenha liderado uma horda de 40 bárbaros no bar “Pra Já”, na última sexta-feira (17), para um confronto com cerca de 60 integrantes da Ultras, que comemoravam 18 anos de existência da organizada.

O bar Prajá fica localizado ao lado do estádio do Atlético e costuma servir de escritório político do ex-capitão-do-mato de Requião, Doático Santos. A proprietária do bar, Maria Bruel, não hesitou em apontar Julião como responsável pelo tumulto. “Foi ele quem comandou os torcedores que chegaram agredindo todo mundo. Eles quebraram tudo”.

Julião foi preso, levado para a delegacia e solto por volta de 4 horas da madrugada de sábado. Como trata-se de um parlamentar, dificilmente responderá a processo. Não porque a lei não permita, mas porque a lei é leniente.

O caso do vereador, no entanto, “enriquece” a Câmara Municipal de Curitiba do melhor da bandidagem. Há pouco, o vereador e presidente do Sindicato dos Motoristas e Cobradores de Curitiba, Denilson Pires (DEM) foi preso na Operação Waterproof, acusado de formação de quadrilha e desvio de dinheiro.

Pouco depois de deixar a prisão, Pires subiu à tribuna da Câmara e chorou, ganhando imediatamente o apoio total e irrestrito de seus colegas.

Pena que o vereador e candidato a deputado estadual, Roberto Aciolli (PV), não estivesse ali para consolá-lo. Aciolli encontra-se em licença para cuidar de sua campanha, mas seu passado é conhecido. O pevista é réu confesso num caso de assassinato ocorrido em 1999. Portanto, se você considera um escárnio a possibilidade do palhaço Tiririca ocupar uma vaga na Câmara Federal, devia prestar atenção no que está à sua volta. Bem pertinho, logo ali, no legislativo municipal de Curitiba.