CARMEN, BRASILEIRA COM CERTEZA
Nada contra o artigo do colunista José Carlos Fernandes, na Gazeta do Povo da sexta-feira passada (aqui). Sempre bem escrito, aliás. Mas é uma bobagem dizer que Carmen Miranda era portuguesa. Ela chegou ao Brasil aos dez meses de idade e ganhou fama menos porque a latinidade estava na moda em Hollywood, mas principalmente porque os Estados Unidos do pós-guerra estavam especialmente assombrados pelo fantasma do comunismo que rondava a América do Sul. De qualquer forma, Carmen foi um estouro.
Há uma cena da "Era do Rádio", de Woody Allen, em que personagens dançam ao som de "American South Way", que é um exemplo primoroso do quanto Carmen contagiou a América (do Norte). Ela encarnava o nosso lado cômico e, por isso mesmo, foi espinafrada pelos nacionalistas de plantão. Os mais azedos diziam que Carmen era a imagem um Brasil festeiro, preguiçoso e... burro. Não era. Ela suou a camisa, o talento e o cérebro para chegar onde chegou.
Talvez aqueles trejeitos e balagandãs de rumba fossem exagerados, e aquela bandeja de frutas sobre a cabeça estivesse longe do tabuleiro da baiana - de inspiração óbvia. Mas nunca a música brasileira ganhou tanto destaque no mundo. E foi graças a Carmen.
A Bossa Nova, que viria, depois foi um evento tímido e circunstrito aos amantes do jazz. O samba cantado por Carmen, ao contrário, ganhou as ruas da América e fez do Brasil um país no mapa, apesar dos americanos insistirem que a nossa capital era Buenos Aires. Tanto pior, Mas Carmen, com certeza, era brasileira.
E Carmen teve sorte. Para alcançar o estrelato, contou com o auxílio luxuoso de uma geração de compositores como Ary Barrozo, Assis Valente, Dorival Caymmi e João de Barro, entre outros, de talentoso musical invejável. Carmen era uma self-made woman mas foi secundada por compositores de naipe que atingiu o topo e, por ironia, a fama de "pequena notável" - Carmen tinha 1,53m de altura e a compensava com saltos plataforma enormes.
Ia escrevendo que Carmen Miranda deixou de ser referência entre os travestis, o que significaria um golpe cruel quando completa-se o seu centenário de nascimento, mas eis que fui ao Largo da Ordem, no domingo, e topei com uma "Carmen" comandando o bloco pré-carnavalesco Garibaldis e Sacis, o único sinal de que existe folia em Curitiba.
Claro que a tal "Carmen" era bizarra, como é próprio de todo homem que se veste de mulher, mas pensando bem, antes "Carmen" que Marta Suplicy, né não?
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